30 de julho de 2010

Convite: LANÇAMENTO DO LIVRO O CROMATISMO CEZANNEANO, DE JOSÉ MARIA DIAS DA CRUZ.

LANÇAMENTO DO LIVRO O CROMATISMO CEZANNEANO, DE JOSÉ MARIA DIAS DA CRUZ.
Dia 30/07/2010

MUSEU HISTÓRICO DE SANTA CATARINA
Palácio Cruz e Sousa - Praça XV de Novembro, 227 - Centro - 88010-400 - Florianópolis - SC
Fone:(48)3028-8091


18 de julho de 2010

Minha cidade...

Moro numa cidade pequena, daquelas em que velhos costumes, apesar dos novos tempos, ainda existem. Claro, que cada vez menos presente na vida das novas gerações. No entanto, reavivada por alguns amantes da terra e de seu legado.
Aqui ainda compramos fiado para pagar no mês seguinte, e a grande maioria dos comerciantes anotam numa velho caderninho as dividas dos clientes. Isso se chama confiança!
Aqui ainda ainda sentamos na calçada para conversar com o vizinho. Debatemos política, trocamos dicas, falamos da nossa vida e da vida alheia Pedimos e emprestamos algo. Isso se chama boa vizinhança!
Aqui as crianças ainda brincam soltas na rua. E podem ir sozinhas às casas dos amiguinhos para brincar, pois não há trânsito e nem risco de sequestro. Isso se chama de infância!
Aqui temos quintal de terra com plantas frutíferas. Temos o leiteiro na porta que vende para receber no final do mês. Temos temos procissão na festa da padroeira com crianças vestidas de anjo. Temos casais que namoram tranquilos no banco da praça sem medo da criminalidade. Temos café feito em coador de pano, torrado e moído em casa. Temos casas de farinha, onde a mandioca é descascada, moída e em família se transforma em farinha e tapioca. Temos carro de boi...benzedeira...costureira...bordadeira...vendedor de pamonha e muito mais.
Todavia, não pensem que vivemos desconectado da tal "modernidade". Aqui temos drogas, que vem de fora para virar a cabeça dos jovens. Temos roubos, gerado pela necessidade de acompanhar os lançamentos da moda: celular, tênis, roupa, etc.(Casos nem tão comuns que causam burburinho em toda a cidade). Temos gente que se tranca em casa vendo TV, e depois aplica em sua vida tudo aquilo que tal personagem faz. Temos Internet e celular por que, se antes, era possível viver sem, agora é impossível. Como se percebe, estamos "antenados". Isso se chama "globalização"!
Mas aqui há algo bem triste: Somos uma "cidadezinha qualquer". Mas não é qualquer cidadezinha que extrai a mesma quantidade de carvão vegetal que nós. Os rios raramente correm água. O calor cada vez mais nos sufoca. A chuva a cada ano diminui o fluxo. os animais sem casa, sem alimento, sem água...vão fugindo, morrendo, acabando...
Olhando tudo isso, fico com saudade do tempo dos meus pais. Tempos que nem vivi, mas que deixaram marcas em mim. Marcas tão profundas que vivo procurando na arte e nas histórias um pouco daquilo. Dia desses, recolhi estes retalhos de poesia e de música que agora se somam á confecção de uma colcha.



Cidadezinha qualquer


Casas entre bananeiras
mulheres entre laranjeiras
pomar amor cantar.
Um homem vai devagar.
Um cachorro vai devagar.
Um burro vai devagar.
Devagar... as janelas olham.
Eta vida besta, meu Deus.

- Carlos Drummond de Andrade -




-Godofredo Guedes
-


Simplicidade


Vai diminuindo a cidade
Vai aumentando a simpatia
Quanto menor a casinha
Mais sincero o bom dia
Mais mole a cama em que durmo
Mais duro o chão que eu piso
Tem água limpa na pia
Tem dente a mais no sorriso
Busquei felicidade
Encontrei foi Maria
Ela, pinga e farinha
E eu sentindo alegria
Café tá quente no fogo
Barriga não tá vazia
Quanto mais simplicidade
Melhor o nascer do dia

- Pato Fu -

11 de julho de 2010

Marques Rebelo: um novo encontro ou reencontro

Bahia – 2010

Querido Marques Rebelo,

Como anda este seu-nosso Rio de Janeiro? De 1930 para cá modificou muito, não é?

Sim, quero dizer que tenho em mãos dois dos seus livros: “A guerra está em nós” e “A estrela sobe”, ambos reeditado pela José Olympio editora. Excelente idéia essa reeditar toda a sua obra. Tem muita gente que precisa te descobrir, ou até redescobrir seu trabalho.

Posso dizer que você me era totalmente desconhecido, ates disso, não fosse o ano de 2008, quando seu nome passa por mim. Eu dava um curso de literatura e estudava o livro “História concisa da Literatura Brasileira”, de Alfredo Bosi, conheci um pouco de você e sua obra. Claro, de forma concisa! Mas julgo que até aí, só seu nome conhecia. No entanto, em 2009, você quis se apresentar a mim, e pelos caminhos da vida talvez, o seu filho, José Maria Dias da Cruz me encontrou num site de relacionamentos, e agora conversamos através de e-mails e MSN. Falamos sobre algumas coisas e entre elas, você. Dele ganhei os dois livros citados. Ele fala de você com muito entusiasmo e amor, vejo que é seu maior admirador.

Marques, percebi que você é um “cara” genial, mas anda um pouco engavetado. O José me disse que isso é obra de um advogado nada honesto que impediu a divulgação das tuas obras, além de usurpar dos seus filhos o que você os havia deixado por direito. É lamentável como os seres humanos conseguem ser mesquinhos e desprezíveis em alguns momentos. Mas bola pra frente, que a José Olympio e o José estão revertendo a situação.

Porém, minha intenção ao lhe enviar esta carta, é simplesmente falar do meu encantamento ao ler seus livros. Em “A guerra está em nós”(lançado em 1968 e reeditado em 2009), viajei pelo enredo, percorrendo o período ditatorial. Gostei muito de a escrita dar-se como em um diário, sendo narrado durante os anos de 1942, 1943 e 1944, numa sucessão de dias. Sempre gostei muito de tudo que se refere a este período. Então, imagine como saboreei descobrir a cada página o cotidiano daquela época. Vi que você brinca com o real dentro da ficção, e isso me deixou maravilhada. Ah, o Rio de Janeiro em meio à ditadura, o cerceamento da liberdade e a guerra mundial, ainda tinha ânimo para fazer o seu carnaval. Política, literatura, música e o dia-a-dia, elementos da memória brasileira, da sua memória, Marques, que nos permite também voltar no tempo, imaginar e também nos encantar e indignar com o momento histórico, com os tipos cariocas, brasileiros que vieram antes de nós. E antes, apenas vistos em filmes, livros de história, e ali em tuas páginas, eram reais, graças ao poder do imaginário.

Mas gostei mesmo foi de “A estrela sobe” (lançado em 1939 e reeditado em 2009). Talvez seja pelo fato de, junto do teu Rio de Janeiro, apresentar os dilemas vividos por uma mulher na década de 30. Sobre a mulher e sua luta neste período, Celi Pinto (2003, p. 33) alerta, “temos de ter em mente que essas manifestações ocupavam as franjas da sociedade. Ou seja, não se constituíam nos assuntos que pautavam as preocupações das elites políticas e culturais da época”. Mas vejo que isso não se aplica a você, pois trouxe uma mulher cheia de sonhos, que fez de tudo para conseguir a independência financeira, não seguir os passos da mãe – mãe, esposa e dona de casa. Você traz mulheres que trabalham (lavam, passam, cozinham, donas de hospedaria, cantoras de rádio, vendedoras, prostituas, operárias, etc.), que repele o amor verdadeiro e se entrega a “vida fácil” para possuir a liberdade. mas noto que você não deixa esta mulher “ao Deus dará”, solta, desamparada. Você a impede de ser apedrejada pelos leitores quando apresenta suas inquietações, seus dilemas, seus sonhos e a forma com que é/são enganada em sua inocência por falsos “amigos”. Lenilza, esta mulher que vive no mundo das cantoras de rádio me encantou, mas não é para menos, vistes o que dela falou Temístocles Linhares, pois bem, reproduzo aqui: “é figura incomparável e sua importância a coloca em primeiro plano no romance brasileiro de todos os tempo”. Marques, fiquei intrigada com uma coisa: Lenilza e Macabeia... “A estrela sobe” e “A hora da estrela” ... Marques Rebelo e Clarice Lispector...É possível haver aí alguma relação? Sei lá o motivo, mas pensei nestas duas personagens.

Acho que já estou ficando prolixa. Quando pego a caneta...Ou melhor, o teclado...

Marques, saiba que foi um prazer conhecê-lo.Até mais...



Fique bem...Abraços

Paula

Sobre o autor



Marques Rebelo (nome literário de Eddy Dias da Cruz), jornalista, contista, cronista, novelista e romancista, nasceu no Rio de Janeiro, em 6 de janeiro de 1907, e faleceu também nessa cidade em 26 de agosto de 1973.

Segundo ocupante da cadeira 9, que tem por patrono Gonçalves de Magalhães. Eleito a 10 de dezembro de 1964, na sucessão de Carlos Magalhães de Azeredo, só veio a tomar posse em 28 de maio de1965, recebido por Aurélio Buarque de Holanda.

Sobre ele: site da Academia Brasileira de Letras: http://www.academia.org.br/abl/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=142

Sobre ele artigo: "O Rio é o mundo:Marques Rebelo no seu centenáriodo" prof. Dr. Mário Luiz Frungillo: http://www.forumrio.uerj.br/documentos/revista_20-21/Cap-9-Mario_Frungillo.pdf

“A estrela sobe” virou filme em 1974, dirigido por Bruno Barreto e com roteiro baseado no livro homônimo de Marques Rebelo. Tendo Betty Faria no papel de Lenilza.

Obras

Romances

  • Marafa (1935)
  • A estrela sobe (1939)
  • O espelho partido
    • O trapicheiro (1959)
    • A mudança (1962)
    • A guerra está em nós (1968)

Novelas

  • O simples coronel Madureira (1967)

Livros de contos

  • Oscarina (1931)
  • Três caminhos (1933)
  • Stela me abriu a porta (1942)

Contos avulsos

  • Conto à la mode
  • Acudiram três cavaleiros
  • O bilhete (1966)

Teatro

  • Rua Alegre, 12 (1940)

Crônicas

  • Suíte nº 1 (1944)
  • Cenas da vida brasileira (1951)
  • Conversa do dia (1951, 1953, 1954)
  • Cortina de ferro (1956)
  • Correio europeu (1959)

Biografias

  • Vida e obra de Manuel Antônio de Almeida (1943)

ANTOLOGIA DE CONTOS PARA AJUDAR VÍTIMAS DAS CHEIAS


TEMPO BOM,


Escritores em Pernambuco organizam antologia de contistas contemporâneos para ajudar vítimas das enchentes no interior do Estado

Nos últimos dias, alguns estados do Nordeste, entre eles Pernambuco, têm atravessado um momento difícil devido às enchentes provocadas pelas chuvas. A antologia de contos Tempo bom foi organizada com o intuito de ajudar as vítimas das enchentes nos municípios pernambucanos mais atingidos.

Organizada pelos escritores Sidney Rocha e Cristhiano Aguiar, a antologia, que será publicada pela editora Iluminuras, reúne um elenco de destacados ficcionistas contemporâneos. Além de nomes como Ronaldo Correia de Brito, Marcelino Freire, Alberto Mussa, Raimundo Carrero, Xico Sá, Rinaldo de Fernandes e Nelson de Oliveira, Tempo bom abre espaço para escritores menos conhecidos como Gustavo Rios, Astier Basílio, Nivaldo Tenório, entre outros. Todos os autores, bem como a editora Iluminuras e demais parceiros do projeto, abriram mão dos direitos autorais e dos direitos de lucro. Desta maneira, toda a venda dos exemplares será revertida em prol das vítimas das enchentes.

Com parcerias já estabelecidas com a Livraria da Travessa e a Livraria da Vila, Tempo bom será lançada simultaneamente nas cidades de São Paulo, Recife, Salvador, Feira de Santana, Juazeiro da Bahia, Petrolina, Juazeiro do Norte, Crato, Fortaleza, João Pessoa no dia 09 de julho a partir das 18h30.

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Serviço:

Lançamento antologia de contos Tempo bom (Editora Iluminuras)

Cidades de lançamento: São Paulo, Recife, Salvador, Feira de Santana, Juazeiro da Bahia, Petrolina, Juazeiro do Norte, Crato, Fortaleza, João Pessoa

Locais de lançamento: a confirmar

Data: 09 de julho

Horário: a partir das 18h30

Contato:

Sidney Rocha (81) 9643-2282 - sidneyrocha1@gmail.com

Cristhiano Aguiar (81) 8555-7220 - cristhianoaguiar@gmail.com

10 de julho de 2010

Selinho: Este blog aquece-me o coração


Sandro do blog http://horasimpossiveis.blogspot.com/ carinhosamente presenteou o Pesponteando com um lindo selo. Deixo aqui meu agradecimento...

Assim devo:

1. Publicar a imagem do selo e dizer quem o passou

2. Responder à pergunta: O que te aquece o coração?

O olhar sincero; a palavra amiga; a humildade nos seres humanos;e toda a pureza que só as crianças exalam. Tudo que é simples, mesmo quando não deveria ser, me comove e aquece o coração.E muito disto, desse encantamento encontro na literaura

3. Passar o selo a 10 blogues

(Eis a tarefa mais árdua, pois tenho tantos que me aquece o coração. Sei que estou sendo injusta com todos os outros.)

http://www.georgiorios.com/ Modus Operandi

http://in-percepcoes.blogspot.com/ (In)Percepções

http://casaazuldaliteratura.blogspot.com/ Casa Azul da Literatura

http://jurigoni.blogspot.com/ Fundo de mim

http://palavrearintenso.blogspot.com/ Palavre(ando)

http://palavraspontes.blogspot.com/ Palavras Pontes

http://eumeuoutro.blogspot.com/ Nas horas e horas e meia

http://neonopaisdamatrix.blogspot.com/ Transcendência

http://teobaldoneto.blogspot.com/ O dobrador de sentimentos

http://taisluso.blogspot.com/ Porto das crônicas


3 de julho de 2010

Cartas...



Sempre gostei de enviar e receber cartas. A sensação da carta na mão faz disparar o coração. A alma tenta prever, sem sucesso, o que o envelope, ainda não aberto, guarda. Às vezes, o remetente pode prenunciar algo desconhecido, outras vezes, algo desejável, esperado. Mas agora, o e-mail, meio de correspondência mais rápido - ajuda a economizar papel, a poupar árvores, mas também, impede de sentir a fragrância que se esconde em algumas cartas, de perceber a lágrima caída que borra as letras, de tocar via imaginário a mão que escreveu a carta - toma conta das relações que vivem na distância. E agora o que acontecerá com as cartas?
Quando era criança perdia tempo mexendo numa caixa cheia de cartas e cartões que havia em minha casa. Lá meus irmãos guardavam cartas/cartões que recebiam de seus amores; meus pais depositavam os cartões que recebiam em datas especiais. Eu lia tudo. Tomava posse de tudo aquilo como se me pertencesse, mesmo nada se destinando a mim. Ainda tenho na alma o gosto daquele ato bisbilhoteiro. Era um prazer que tempos depois descobri ao ler alguns livros.
Quando minha família não mais recebeu as tais correspondência, visto que meus irmãos foram se casando, e os cartões à meus pais foram substituídos por "presentinhos", eu, enfim, comecei a sentir o gosto de receber cartas/cartões enviados por parentes, amigos e colegas. Trago todas guardadas para que um dia, alguém movido pela curiosidade, sinta o prazer da leitura de algo que não lhe é endereçado.
Imaginem então, como me sinto feliz quando descubro que alguns autores tem suas correspondências publicadas em livro. Senti aquele gostinho novamente. Um gostinho duplo, proporcionada pela leitura e pelas correspondências. Já que não acho interessante publicar aqui minhas correspondências, segue abaixo alguns trechos de cartas trocadas entre Dummond e pessoas ilustres e com anônimos:

ILUSTRES

De Drummond para Graciliano Ramos, 1945:

"Meu caro e grande Graciliano: Até o mais espinhosos dos amigos --ou dos críticos-- reconhecerá em 'Infância' a obra de arte que ela realmente é. Nada lhe falta, nada lhe sobra. A palavra justa exprimindo sempre uma realidade psicológica ou ambiente; a notação precisa; a dosagem sábia; a economia absoluta de efeitos, notações, recursos. Enfim, um desses livros que a gente desejaria ter tutano para escrever, e que lê com uma admiração misturada de raiva pelo pelo danado que conseguiu compô-la: raiva que é o maior louvor, tanto vem ela impregnada de entusiasmo e prazer. (...)"

De Drummond para Clarice Lispector, 1945:

"Clarice, querida: Ler ou reler você é sempre uma operação feliz: descobrem-se coisas, aprimora-se o conhecimento das descobertas. Senti isso percorrendo "De Corpo Inteiro"! e "Visão do Esplendor". Obrigado, amiga! O abraço, a admiração, o carinho do Drummond."

De Carlos Lacerda para Drummond, 1975:

[no Natal, Lacerda envia bilhete oferecendo um livro da Nova Fronteira, editora que criou] "Para Carlos Drummond de Andrade, que não gosta de mim mas certamente gosta de Fernando Pessoa e há de goastar do Otávio Araújo, a Nova Fronteira oferece, Natal de 75, Carlos Lacerda".


De Drummond para Lacerda, 1975:

"Agradeço-lhe vivamente, e à Nova Fronteira, o magnífico exemplar de 'Ode Marítima' de Fernando Pessoa, com que me distinguiram neste Natal. Realmente, é um fino objeto de arte, a que Otávio Araújo deu contribuição relevante, para maior glória do poeta. Parabéns à arte gráfica do nosso país. A afirmação de que 'não gosto de você' seria pelo menos exagerada, se não fosse, como é, totalmente errada. Ninguém é indiferente ao 'charmeur' fascinante que você é, e mesmo os que supõem detestá-lo, no fundo gostam de você. Gostam pelo avesso, mas gostam. Quanto a mim, tenho presente que fomos bons camaradas na luta perdida da ABDE, e que lhe dei o meu voto para Governador (voto de que não me arrependi, em face dos lances criativos do seu Governo). Apenas, discordei de posteriores atitudes políticas de você, o que é coisa comum na vida, e não afeta relacionamento pessoal. Certo?"

NEM TÃO ILUSTRES:

De Laudinor Brasil (Vitória da Conquista-BA) para Drummond, 1944:

"Com a presente, estou lhe enviando um soneto que escrevi, após a leitura do seu grande livro de admiráveis poemas - Poesias. Que tal? Presta? Não presta? Pouco importa. Tem para mim um sincero valor: --a intenção de rende ruma homenagem ao grande poeta que, ao lado, ou melhor, à frente de Manuel Bandeira, Jorge de Lima, Vinicius de Moraes e outros-- vem enriquecendo, com a cooperação de príncipe indiano, a poesia brasileira.

[ e vem o soneto]
Destino...
Como Carlos Drummond de Andrade, achei
Uma pedra tambem no meu caminho.
E, porque a vi, a meditar sozinho
Os segredos da vida desvendei.

Vi que o Destino é sempre o eterno rei,
Tiranico, sarcástico, escarninho.
E vi, morrendo, à voz do rei mesquinho,
As ilusões mais doces que eu sonhei

[o poema e a carta continuam] (...)"

De Drummond para Laudionor Brasil, 1944:

"Recebi há dias sua carta e o soneto que a acompanha. Muito obrigado. Mas confesso-lhe que me surpreendi ao ver surgir, ao lado de minha modesta e atacada 'Pedra no caminho', um soneto que lhe interpreta e desenvolve o sentido. Porque a referida pedra --vou usar de toda a franqueza-- não tem sentido algum, a não ser o que lhe dão as pessoas que a atacam e com ela se irritam. É uma simples, uma pobre pedra, como tantas que há por aí, nada mais. O poema (se assim se pode chamar) em que ela aparece não pretende expor nenhum fato de ordem moral, psicológica ou filosófica. Quer somente dizer o que está escrito nele, a saber, que havia uma pedra no meio do caminho, e que essa circunstância me ficou gravada na memória. Como vê, é muito pouco, é mesmo quase nada, mas é o que há. Suas palavras a respeito de meu livro são muito generosas. Mas acho que não têm razão de ser. O melhor é nós contemporâneos não nos julgarmos uns aos outros. Já é tão difícil e dá margem a tantos erros julgarmos os antigos! Ninguém sabe o que vai ficar do que se escreve em nosso tempo.Provavelmente ficará o que hoje não agrada ou não é percebido. Tudo é muito nebuloso e discutível, no presente. E quase nada resiste ao tempo. Já não falo na posteridade: falo em cinco, dez anos mais tarde...

Desculpe se estas palavras lhe pareceram mal humoradas, pois ralmente não o são. Minha intenção é o menos irritante possível. Quis ser sincero com um patrício distante, que me escreveu sobre poesia e que revela, talvez, um excessivo entusiasmo, de que eu não participo. Agrada-me saber que em Conquista alguém se preocupa com versos e se lembra de escrever a outra pessoa que também se preocupa com eles. Mas não convém admirar demais: e eu lhe juro que nem eu nem nenhum dos poetas citados em sua carta somos príncipes indianos, que enriquecem a poesia brasileira.

Cumprimenta-o com simpatia cordial, contente por havê-lo conhecido,

De Drummond para Yola Azevedo (São João da Boa Vista-SP), 1982:

"Na leitura observei pequeninas coisas, que lhe transmito pelo meu vezo de reparar em coisas pequeninas e dar-lhes importância formal. A primeira não será assim tão mínima, por isso lá vai de saída. Eu acho que o problema que se apresenta ao escritor novo, atualmente, é estabelecer certo equilíbrio natural entre linguagem escrita e linguagem falada. Ele precisa usar o vocabulário e a construção do dia, mas deve utilizar as expressões antigas e elegantes que constituem o tesouro da literatura, representado, digamos, por um Machado de Assis. Na boca de uma personagem, cabem todas as gírias e modismos referentes ao seu meio social, mas já na escrita do narrador eles devem ser evitados. Dizer por exemplo que uma sucessão de mortes "é incrível", está bem quando é a pessoa imaginária quem fala, mas para o escritor nada é incrível, inenarrável, assombroso. Os adjetivos desse tipo são uma fuga à obrigação de definir o fato ou a sensação. Uma sucessão de mortes, brutal e imprevista que seja, pode ser contada também de maneira brusca e seca: "Perdeu o irmão num acidente, o pai de infarto, a mãe de trombose. Em três meses." (Ou cinco, ou seis). Ou coisa parecida. Já o leitor, vendo isso, tem o direito de dizer: "É incrível!". (...)

Acho bom, também, evitar expressões esteriotipadas, como "divino milagre" (todo milagre é divino), "fazer das tripas coração", "mergulhar num mar de tristeza", que são lugares-comuns. Deixar de lado, igualmente, citações desnecessárias, como a do inferno de Dante, que se popularizou e é usada por todo mundo que nunca se aproximou da "Divina Comédia". Citação é ótima quando totalmente inesperada. (...)

Repare como a palavra "muito" nem sempre indica muito, mesmo. Às vezes "senti falta" diz mais do que "senti muita falta". O substantivo bem empregado é sempre forte em expressividade, e não raro dispensa a muleta do adjetivo.

Como você vê, são coisinhas, pinçadas pela mania que cultivo, e que você acatará ou não, sem o menor constrangimento. Por favor, não me tome por um censor literário, crítico ou coisa que o valha; tenho horrora essas coisas, mesmo porque não tenho formação especializada para criticar, e confio muito na autocrítica do autor, que se desenvolve com o tempo até tornar-se afiadíssima. Se me permiti apontar essas coisicas foi porque confio em sua força e compreensão. Valeu? (...)"

De Drummond para Edmílson Caminha (Fortaleza-CE):

1982: "Haverá nada mais fino, obsequioso e encantador do que um casal cearense? Vocês dois nos maravilharam com o belíssimo presente do artesanato local, que eu chamarei, com justiça, de objetos de arte. (...)".

1983: "Sua amizade é das que não falham _espécie preciosa e reconfortante. Envelhecer não é assim tão difícil quando se conta com esse apoio moral. Obrigado pelas palavras de carinho e pelo inigualável doce de caju, uma das glórias cearenses que não me canso de celebrar... e de degustar. (...)"

Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), possui 1.812 correspondentes registrados no arquivo do poeta na Fundação Casa de Rui Barbosa, no Rio.


O POEMA DA BAHIA QUE NÃO FOI ESCRITO

-Carlos Drummond de Andrade-



Um dia – faz muito tempo, muito tempo –
achei que era imperativo fazer um poema sobre a Bahia,
mãe de nós todos, amante crespa de nós todos.
Mas eu nunca tinha visto, sentido, pisado, dormido, amado a Bahia.
Ela era para mim um desenho no atlas,
onde nomes brincavam de me chamar:
Boninal,
Gentio do Ouro,
Palmas do Monte Alto,
Quijingue,
Xiquexique,
Andorinha.
– Vem... me diziam os nomes, ora doces.
– Vem! ora enérgicos ordenavam
Não fui.
Deixei fugir a minha mocidade,
deixei passar o espírito de viagem
sem o qual é vão percorrer as sete partidas do mundo.
Ou por outra, comecei a viajar por dentro, à minha maneira.

Ainda carece fazer poema sobre a Bahia?
Não.

A Bahia ficou sendo para mim
poema natural
respirável
bebível
comível
sem necessidade de fonemas.

ANDRADE, Carlos Drummond de. Amar se aprende amando. Rio de Janeiro: Record.